sexta-feira, 3 de julho de 2009

DIFERENÇAS ENTRE - arte Arte e ARTE

Havia um vazio profundo que nada nem ninguém conseguia preencher. Era um viver penalizando-me e penalizando os outros que me tinham tornado assim, não tendo ainda tomado consciência que tudo estava em mim. Esse emaranhado de sentimentos começaram a aflorar com uma necessidade de evoluir interiormente e isso implicaria o sair, o encarar o mundo. Não podia continuar a fugir de mim e dos outros, para com um egoísmo adulador tentar marcar a diferença e justificar a não capacidade de edificação. Ouve uma necessidade muito grande de me conhecer, de tentar saber o que toda a gente questiona, porque por mais diferentes que nos achemos não passamos de simples mortais, do porque é que somos e para onde vamos.

Sendo o transpor para o papel uma auto terapia, senti necessidade de passar para o exterior as minhas sensações através da pintura, experimentando fazê-lo com um pouco de vergonha por lhe chamar isso. Mas como poderei chamar às telas onde coloquei, através das cores, o que sentia no momento. “Arte - aplicação de conhecimentos racionais e de meios especiais à realização duma concepção. Opõe-se à ciência teórica e à prática espontânea. Conjunto dos meios que o ser humano emprega para exercitar sensações, sentimentos e em especial o sentimento do belo. Como para tudo existe um mas, também pode significar ardil, maldade, artifício, astúcia, modo, jeito.” Definição retirada da enciclopédia Lello Universal.

Poesia, arte, literatura são conceitos eivados de uma subjectividade concreta. A vida é toda um emaranhado de situações dúbias, reais e irreais, uma amálgama de sentimentos, manifestados através das formas mais diversas, desde o crime ao amor, da delicadeza à avidez. Todo este conjunto de sentimentos, sentido quotidianamente por quantas pessoas que respiram, não são levados até às últimas consequências, não são apreendidos, nem retratados. Não são mesmo vividos, são muitas vezes apenas percepcionados. Contudo, a vida seria bem melhor se as situações fossem efectivamente vividas. Mas por vezes as pessoas não têm ou não querem ter sensibilidade para tal, pois os seus afazeres absorvem-nas de tal forma que nem tempo têm para ler, admirar ou até Pensar. Porque digo isto? Exactamente porque poesia, literatura, pintura, enfim Arte, tentam através da sua forma subjectiva levar a complexidade da vida junto das pessoas, mostrar-lhes as situações concretas, denunciando-lhes tudo o que a elas pouco lhes diz na aparência, mas que através de metáforas e enquadramentos entendem, meditando depois.

Como diz o poeta: “A arte é um encontro e há tanto desencontro nesta vida”. É isto. A arte é um encontro, é o encontro da beleza com a realidade ou a busca do caminho para tal, é o encontro das pessoas, por si só e entre elas, é a comunicação da vida, é o dar de cada um, é a vivacidade de saber viver, de saber compreender, de saber transmitir.

A arte não é só apreciar que as cores das aguarelas estão bem enquadradas naquele motivo, é saber, porque motivo elas se transformaram em quadro. E aí sim, aí teve de se ir ao âmago da imaginação de quem pinta e de quem sente a pintura. Aí, tentou saber-se o porquê daquele quadro e não doutro e o que pretende ele transmitir. Porque será que a rosa e a pomba brancas, são símbolos do amor e da pureza? Porque é assim que o amor deverá ser, será? Assim a Arte tenta mostrar ao mundo, o que o mundo não quer ver. A sensibilidade inerente à sua própria condição, leva-os a identificarem-se com esta ou aquela forma de sentir e depois relatam, transmitem, querem ser compreendidos. E era bom que fossem. Os desencontros da vida, a não identificação entre o pobre e o rico, entre o intelectual e o popular, entre o homem e a mulher, a guerra e a paz, o bem e mal, amor e ódio e um não mais acabar, são temas que integram as obras de arte, quer seja de Arte propriamente dita ou da arte em geral. É aqui que a arte encontra a vida, é aqui que a arte se dá, para receber da vida. Bela, feia, recalcada ou liberta, activa ou apática é esta vida que a Arte expressa. São as realidades da vida que através dela se expandem, se propagam e se divulgam. Mas não é só isto. É também o saber fazer isto, saber transmitir, saber divulgar. Muitas pessoas estão fechadas e é para com essas que é fundamental que a arte funcione. É contra esta vicissitude que muitos artistas devem lutar. É neste campo que eles devem combater para mostrar que a arte, com “A” grande, é sentir, é viver, é ser.

Tema controverso este da arte. Ou da Arte? Tema passível de várias interpretações, dependendo da arte de sentir. Mesmo sem sermos artistas vamos aprofundá-lo, porque para tudo é preciso arte e em especial para viver. Mas nem sempre o que temos dentro de nós está pronto para ser mostrado de uma forma bela aos olhos de todos, por isso o que para mim se tornou muito importante, foi mostrar sem medo o que à partida poderia não ser belo e muito menos Arte, mas que seria a única forma de lá chegar.

Já que não tenho alma de Artista quero ser artista com Alma. Sem medo ou vergonha de ser o que sou.

Não sei se foi por me ter debruçado sobre o significado da palavra Arte que despoletou em mim uma vontade imensa de pintar e desenhar ou apenas o ter descoberto que não conseguia descrever o que sentia através das letras e que talvez o conseguisse colocando para a tela as cores da alma. Assim fiz, não sendo um trabalho com técnicas de arte ou esteticamente belo, teve na altura e mesmo agora à distância um valor muito especial, do qual não me envergonho, antes pelo contrário, pois como tudo, também fez parte da procura para me conhecer. Comecei pelo desenho à vista, a lápis. Foram os meus primeiros trabalhos mais sérios e talvez razão para terem sobrevivido até agora. Como acontece com tudo na vida, pouco a pouco fui perdendo o medo de não ser capaz e ganhando coragem para me aventurar em novas experiências, passando da simples folha desenhada a lápis de cor, passando para o carvão, aguarelas, até me aventurar à tela e ao óleo.

Cada um sente o que sente como sente. Se uma criança ler estas palavras e estiver no grupo dos privilegiados que nada lhe falta, possivelmente perguntaria à mãe se esta pessoa tinha problemas mentais. Não estaria de todo errada, era por tê-los que dava tanta importância a tudo que de seu poderia ficar exposto, ser criticado ou rejeitado. A pseudo artista só mais tarde veio a perceber o valor da sua obra, não por ser uma obra de arte, mas sim por ser a Arte para conseguir viver.

(in: nas asas do vento encontrei) Dina Ventura