quarta-feira, 25 de agosto de 2010

TRIPLICIDADES


Óleo do pintor Bernardino Costa - BC














TRIPLICIDADES
De flor passa a adaga
Destroços do que já era
Embates de velas e mastros
Acumulados no convés.
E dos traços, sulcados a cor
Nasce o engrossar do esboço
Por vezes reabre a dor
Por mais que seja o esforço.
E escondendo o traço feito
Repõe o que era passado
Carrega nas marcas da tinta
O que já era e foi renovado.
Assim de um passa a dois
De dois resta apenas um
Os dois fazem sentido
Um só não faz sentido algum.
E agora para completar
Compõe a tela primeira
Que representa a origem
Dando aso à terceira.

Dina Ventura 25 de Agosto 2010

FLOR DE LIS


Óleo do pintor Bernardino Costa (B.C.)

Entre pássaros, pétalas e penas
Canas, telhas e traços
Correm as estrelas em cantos
À espera de pequenos abraços.
E envoltos nos arremessos da vida
De amarelo e azul se compõem
No embate a que os tons obriga
Enquanto os destroços se expõem.
E assim no tom que juntos emanam
De verde quase se vestem
Mas sem se misturarem não ganham
As cores que no sonho investem.
E assim despidos da cor
Que na mistura daria
Brota o Lis em Flor
Ganhando vida e magia

Dina Ventura 25 Agosto de 2010

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

EU E ELE


As diferenças
Estão
No manejo da inteligência
De forma pouco harmoniosa
Com as tradições.
Será o acto poético uma mentira?
Será a poesia apenas
Arredores do meu íntimo?
Tenho sempre de regressar a mim
Tenho de olhar
Todas as maneiras de ser
E sentir com o que me cruzei.
Chega a altura de me fechar
Bem dentro do meu espírito
E Escutar
A minha sensibilidade
Não me deixa
Envolver por dogmas
Não me deixa aceitar sem compreender.
Para que entenda a vida e os seus enigmas
Não
A solução não está na religião.
Está no Eu.
Há no Ser e Sentir.
A religião da palavra
Proferida com Energia
Emanada da alma.
O meu laboratório
A minha alquimia profética
É a escrita.
Nela, experiencio, me ouço e me entendo.
Me Toco
E encontro Algo para além de mim.
Gostava que sentissem o que escrevo
Mas sei que não é possível
Pois tudo o que escrevo
Na minha Alma fica
E na minha carne se impressa.
Seja a dor física ou da alma
As alegrias ou tristezas
Os sofrimentos recônditos
Que não consigo passar.
Sendo dor dos meus sentidos
Refugia-se no que sinto
Enquanto que quem lê
Sente, mas o que é dele
Porque não minto
No que sinto
E faz doer.
Portanto rebusco como se pode sentir
O que não é nosso, nem foi
E do que se pode gostar
Depois de imaginar.
Olhei Pessoa e questionei-me
Se serei como diz
“Que a sinceridade emocional, falha de verdadeira sinceridade”
Talvez, pois acho que a alma dita
E não tem vida na terra
Pois pertence a outro lugar.
A minha chave está
Na minha personalidade, desde criança.
Desde a inadaptação ao presente
A “saudade de qualquer coisa”
A quem chamo quem sabe futuro
Ou no fundo a saudade de um lugar
De onde vim.
Com a saudade psíquica
Relembro
Com a saudade metafísica,
Quero acreditar
Que existe.
É um Lar.
Ou serão as minhas raízes índias
Que me tentam alertar
Ligadas a um passado longínquo
Para ouvir o chamado e acreditar.
De tal modo abstracto e vago
Que há a transferência para o futuro
Talvez a viabilização de encontrar
A forma de saltar o muro.
Será que a alma de poeta tem pátria?
Ou tem simplesmente Universo?
É presunção?
Ou constatação?
A escrita serve sempre de elemento compensador
De tudo o que falta, não existe ou não se conhece.
Luto para ser ponderada
E a alma por vezes rejeita…
Quer ser livre
Quer lançar-se no vento
Por isso nas asas do vento encontrei.
O meu destino está em mim
E na escrita me alimento.
São tempestades mentais
Bonanças reconfortantes,
Terapias empolgantes
E descansos fluviais.
Força Universal
Que envolve todos os seres
Que faz de todos poetas
Mesmo não querendo ser.
Existe algo na minha mente
Que vai regando a minha escrita
Pode ser sentimento indefinido
Para quem não acredita.
É um paraíso perdido
Perdido no antes de nascer
Um acto de ser feito
Enquanto se percorre a vida
Ou quem sabe ao morrer.
No fundo será
Nesse local distante,
Mas presente
Mesmo ausente,
Onde a inspiração brota.
É no desamor que se preenche
Pois o amor de carne é.
O que me comanda é o espírito
Por isso sinto o espírito apenas.
Fiz sempre tudo sozinha
Nunca copiei de alguém
E agora ao ler o que leio
Não consigo entender
Se o fazem porque é bem
Ou se porque nasce do ser.
E depois de parar para pensar
Foi o que ganhei por querer
Pensei sentir inveja
Por o fazerem “bem feito”
Mas afinal não era isso.
Por defeito ou qualidade
Eu preciso ser diferente
Na minha forma de ser
Gosto de ser Eu,
Sendo gente.
Sou livre ao escrever
Mesmo em verso e não verso
Consigo dizer o que sou
Não quero
Parecer-me com ninguém
Porque é de mim que dou
Mesmo que me achem não poeta
Porque sinto a alma repleta
No que é meu e não emprestado.
Não gosto de influências
Gosto de seguir em liberdade
Só tenho pena de não saber escrever
Como uma grande sumidade.
Mas não nasci para isso
Nasci para mostrar quem sou
E mesmo apoiada no que era
Até parecendo feitiço
Nunca desesperei na espera.
E quando me apaixonei
Pela alma de Pessoa
Senti que o reneguei
Pela minha escrita não ser boa.
Mas depois da paixão assumida
Interiorizei na minha alma
Que o não ser conhecida
Me trazia muito mais calma!
E mesmo com dúvidas
Planto e semeio
Na alma
As flores.
Enfrento
Com algumas dores
De peito aberto
As palavras
Sem receio.

Dina Ventura 20 de Agosto de 2010

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

AS FORÇAS DA NATUREZA - OS MITOS NA PINTURA


óleo - Iansã - O Fogo e a Paixão - Dina Ventura
É a divindade do fogo, dos raios e da guerra
É ela quem trás as tempestades e a ventania
Para varrer a maldade humana da terra
E domina os furacões e ciclones,
Está presente nos ventos fortes,
No deslocamento de objectos sem vida.
Senhora do barro vermelho e da sua lama.
Deusa da espada de fogo,
Dona das paixões.
Convivemos com esta Força da Natureza diariamente.
É o vento, a brisa que alivia o calor,
Mas também o calor, o tremer dos ramos,
Dos cabelos, a lava vulcânica,
O fogo, o incêndio, a devastação pelas chamas.
Sente-se no poder do raio,
Na electricidade,
Está presente no simples acto
De acendermos uma vela ou uma lâmpada,
É o choque eléctrico,
A energia que gera o funcionamento do rádio,
Televisão, computador,
É a energia viva, pulsante e vibrante.
Força da provocação e do ciúme,
Mas também da paixão violenta que corrói,
Criando sentimentos de loucura,
Desejo de possuir.
A sua cor é o laranja e a cor de fogo.
Ela é o desejo incontido,
Sentimento mais forte do que a razão.
A frase “estou apaixonado” tem a sua regência,
Energia que faz os nossos corações
Baterem com mais força
E cria na nossa mente
Os sentimentos mais profundos,
Ousados e desesperados.
É o ciúme doentio, a inveja suave,
O fascínio enlouquecido, em suma é a paixão.
É a disputa pelo ser amado,
O não medo das consequências
De um acto impensado
No campo amoroso.
Ela vai até à vontade de trair,
De amar livremente,
De deixar fluir.
Rege o amor forte e violento.
Conhecida por guerreira de fogo
Gosta de participar em tudo,
É vingativa com aqueles que não a respeitam,
Porém não mede esforços
Para agradar quem a reverencia.
Foi rainha
É protectora dos bombeiros
E de todas as mulheres guerreiras.
Iansã.

Dina Ventura - in: nas asas do vento encontrei

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

AS FORÇAS DA NATUREZA - OS MITOS E A PINTURA


óleo - OS CAMINHOS - Dina Ventura


OS CAMINHOS
Força da Natureza que está presente Nos momentos de impacto e fortes,
Sendo aí que o seu encantamento se faz sentir,
Bem como numa colisão
No ar, mar ou terra,
No estrondo provocado por algo pesado que cai,
Na explosão, no derramamento do ferro fundido.
No dia a dia encontramos esta energia nos estaleiros,
Oficinas, ferreiros, quartéis,
No disparo de uma arma,
No acto de se afiar uma lâmina,
Serrar, martelar um prego,
No despertar de um relógio,
No grito de raiva,
Na dor aguda da faca ou da bala que penetra a carne,
É nestes actos que o seu encantamento se faz sentir.
É assim a Energia do impacto,
Da detonação, da vida mantida acesa num ser,
Da defesa e da guerra,
Gosta de lutar e é imbatível,
Mas pode também evitar uma luta.
É também a viagem, a estadia longe,
Os veículos, a jornada, a empreitada, a luta do dia a dia.
É os caminhos-de-ferro, o som do comboio nos carris.
Considerada uma força impiedosa e cruel,
Podendo até passar essa imagem,
Mas sabe ser dócil e amável.
Foi considerado chefe
Porque foi ele que abriu caminho
Para que todas as divindades chegassem ao mundo.
É a franqueza, decisão, convicção, certeza,
O facto consumado.
É a própria energia, incontrolável, devastador,
É a vida na sua plenitude.
Está também presente nas construções,
No cimento, na muralha, é o obstáculo difícil de vencer.
Ele é aço donde são forjados os instrumentos
Como a espada, a faca, a lança
E ainda o carvão mineral docemente em estado bruto.
O acto de cortar também lhe pertence.
Assim são os caminhos e o desbravar!!

Dina Ventura - in: nas asas do vento encontrei

AS FORÇAS DA NATUREZA - OS MITOS E A PINTURA


óleo - O INICIO - Dina Ventura

Primeiro nascido da existência e como tal,
O símbolo do elemento procriado.
É o princípio de tudo,
A força da criação, o nascimento,
O equilíbrio negativo do universo,
O que no entanto não significa coisa ruim, mas sim o antídoto.
É a célula mãe da geração da vida,
O que gera o infinito infinitas vezes.
Força natural viva que fomenta o crescimento,
É o primeiro passo em tudo,
O gerador do que existe, existiu e existirá.
Está presente mais que em tudo e todos,
Na concepção global da existência.
Ele mantém o equilíbrio das trocas,
Provoca o conflito para procurar a síntese,
Tudo o que se une, se multiplica, separa e se transforma
É princípio da transformação.
Estando assim associado ao nascimento e ao futuro.

Dina Ventura - im: nas asas do vento encontrei

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

A CHEGADA - III - HÁ MAIS


Pormenor da tela do pintor Bernardino Costa (B.C.)

Só pode haver.
Algo ou algos dentro de mim,
Que fazendo parte de um Todo,
São Todos também.
Tenho de os ver assim.
O tempo que demora a desbravar
É directamente proporcional
Ao que sinto desbravar em mim.
Não sei se será egoísmo,
Mas não,
Penso que é necessidade de crescer.
Como uma fonte.
Se a comparação for vaidade
Ou pretensiosismo, assumo.
A Fonte apoiada na sua nascente
Deixa que água brote, com que finalidade?
Não acredito que seja apenas por...
Há uma interligação entre essa fonte
E tudo o que ela poderá abranger,
Sendo tanto maior
Quanto maior o alimento na nascente,
Tornando-se depois numa necessidade,
Utilidade cíclica.
No final de tantas voltas
Chego à conclusão
Que tudo era muito mais simples
Do que sempre imaginei
E que só somos de Verdade quando:
Chegamos a nós e aos outros;
Que não estamos sós;
Que temos a energia suficiente e necessária
Para chegarmos à Luz.
Parece realmente fácil,
Mas para isso é sempre necessário
Percorrer um caminho.
Quem tiver a Sabedoria para o encontrar
Sem sofrimento,
Tanto melhor, se é que é possível,
Porque questionarmo-nos profundamente,
Olharmo-nos no fundo da alma
Por vezes é difícil,
Mas sem o fazermos não conseguimos chegar.
Não basta socorrermo-nos
De quem julgamos ter poderes sobrenaturais
E pós mágicos,
Pedindo-lhes que façam por nós
O trabalho doloroso
Ou nos cedam a fórmula milagrosa
Que nos permita transformar a nossa vida
Apenas com um pedido ou pagamento,
Sem que tenhamos a consciência plena
De que os obreiros edificadores somos nós
E que nem os deuses o farão,
Apenas nos poderão ajudar a ter forças
Para levar a bom termo a tarefa,
Caso vejam que o sentimento que nos impele é nobre.
Eles podem ajudar,
Mas apenas dentro de nós encontramos a poção certa,
Difícil é chegar até ela pelo caminho certo.
Mesmo às apalpadelas,
O que conta é a Vontade de Encontrar,
Tomando consciência
Que nem sempre o caminho que escolhemos é o melhor.
Chegando a essa primeira verdade,
Retomamos e chegaremos.
É a aprendizagem.

Dina Ventura in: nas asas do vento encontrei

A CHEGADA - II - OPTO


Pormenor - Tela do pintor Bernardino Costa (B.C.)

A temperatura é amena,
Permitindo que uma aragem bem fresca me toque.
A sensação é agradável.
Olho em redor
E vejo-me acompanhada da beleza,
Da frescura daquele lugar
E do envolvimento com a Natureza.
Volto a olhar para o cartão que me tinha levado até ali.
Palavras amarradas a um papel com o intuito de ferir.
Tento reler
Mas apenas vejo um cartão em branco
E apenas me sai:
Neve ou luz.
Sem grandes focagens
Apenas tento seguir em frente,
Em qualquer direcção.
Opto.
Sem optar,
Apenas impulsos,
Sigo sem rasto
O que o meu poder de orientação me indica.
Algo lá ao longe se começa a desenhar.
Não uma miragem
Mas a possibilidade de ser algo.
Caminho apenas embalada
Pela vontade de chegar.
Reúno em mim a construção
Do que estará lá,
Questionando-me se o será mesmo.
Nada melhor do que a curiosidade
Para o confrontar.
E se não for?
Algo será.
Só me resta saber.
Tremo.
Não na emoção da procura
Mas sim na emoção do encontro.
É algo superior a mim,
Incontrolável,
É um vibrar interior,
Que suplanta todas as emoções,
Porque as contém.
À medida que os contornos se vão tornando
Cada vez mais nítidos,
Facilmente me apercebo do que é.
Após uma análise superficial,
Sinto que posso continuar.
Há mais.

Dina Ventura - in: nas asas do vento encontrei

A CHEGADA - I - ENTRO


Tela (pormenor) do pintor Bernardino Costa

Prostrada perante mim,
Embalada pelo calor que se faz sentir,
Olho sem conseguir enxergar nitidamente ao longe,
Mas semicerrando os olhos
Os contornos tornam-se mais nítidos.
Vou aproximar-me mais,
Apesar de saber que o caminho poderá ser longo,
Inútil e quem sabe, sem fim.
Compenso o calor desagradável
Com pensamentos frescos,
Ando sem parar,
Deixando que o fresco interior
Me apazigúe a caminhada.
Todo o percurso é árido, ressequido,
Apenas quebrado por uma solitária verdura
Que teima em sobreviver,
Um pouco fora do sítio.
Olhando mais atentamente para o seu verde,
Recobro as forças para avançar
Em direcção ao que me parece estar ao longe,
No fim da caminhada.
Esperança muito real,
Pois será onde descansarei após tal percurso.
Chego.
Paro e vejo que aparentemente valeu a pena.
Não sei se o interior será melhor ou pior,
Só sei que a entrada é frondosa
E dum verde inimaginável.
Folhas balançam de mansinho
Como que para afastar o calor,
Protegendo aquela entrada, gruta talvez,
Refrescada por uma pequena cascata
Com ar de velha habitante,
Que mais parece querer preservá-la.
Tudo me é familiar.
Com facilidade contorno um pequeno lago natural,
Equilibrando-me sobre as pedras
Que parecem postas ali ao acaso
Mas propositadamente alinhadas.
Chego à entrada
Um pouco dissimulada por plantas altas,
Canas que se vergam em sinal de vénia respeitosa
À luz que deixam entar.
Entro.

Dina Ventura - in: nas asas do vento encontrei