quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

PAREDES FORRADAS

Forrada de papel, de cetim, de madeira ou pedra, mudou?
Mas ela continua lá. Muda a fachada mas o conteúdo é o mesmo.
Não será. Talvez por oculto, mais corroído se torna.
Jaz inerte, sem respirar e aparenta a cara que não tem.
Roça-se no disfarce airoso da beleza que não é sua e convence-se.
Ninguém ousará retirar-lhe os enfeites.
E assim recomposta, numa vaidade comprada, vive.
Cega, porque vê por olhos que não são os seus.
Surda, porque não é aos seus ouvidos que os sons se dirigem.
Muda, porque não se pode denunciar.
Ausente, mesmo presente, porque o que prevalece são as capas.
Se na fúria da liberdade, arranca o que a forra que vê?
Restos da tinta original. Mistura de caliça com cola.
Desenhos desbotados de um papel arrancado.
Resta a parede que tentando firmeza, aguarda.
Não se convencendo que não passa, mesmo sem o forro,
De mais e apenas, uma parede forrada.

Dina Ventura – 27 de Dezembro de 2009