segunda-feira, 31 de maio de 2010

ENCANTAMENTO E POESIA


O encantamento é a acção
Que a filha do Sol exerce junto dos outros,
Para poder manter junto de si o que deseja.
Apesar do que Circe fez, que comove e faz pensar
Não tinha o direito, de por egoísmo, aos outros retirar.
Mas tudo é possível na poesia, tudo se pode alcançar.
Sem verso, sem rima, sem concreto ou abstracto,
Tudo se pode realizar.
Não existem barreiras,
Nem fronteiras, críticas ou bandeiras.
A nação é só uma!
Lá, ninguém pertence a nenhuma.
É o centro do universo, dento do Universo em centro.
Reflecte-se em si, fora de si,
Num encontro intimo que só a ela pertence!
Nem todos a entendem, mas todos se deleitam,
Tentam interpretar, copiar, redigir e reflectir.
Pensam que conseguem, mas o encantamento não deixa.
Existe nele a falsa dor, a dor do falso sentir,
No sentir o que é a Dor.
E aí se perdem os poetas, os realistas, os pensadores
E até doutores.
Ditam, reescrevem e fazem da poesia o que quiserem.
Mas ela é Ela, sem rodeios, anseios ou pretensões.
Está-se nas tintas, com as tintas do que pretende pintar.
Sim, porque poesia não é escrita, poesia não existe,
Ela apenas subsiste e persiste na imensidão do Ser.

Dina Ventura

ESPÍRITO DA CARNE


Óleo s/tela - O espiríto da carne - do pintor Bernardino Costa - 1ª fase

Dos músculos à parte mole do corpo,
Tal como a polpa de certos frutos
Assim é a natureza humana
No ponto de vista da sensibilidade.
Pois como diz o ditado “a carne é fraca”.
Que seria então dela sem o espírito?
Seria devorada
Como a de um animal ou fruto qualquer.
Para sobrevivência, gula ou simples prazer.
Que forma anímica lhe incute
Essa substância incorpórea?
Esse espírito?
Dá-lhe o alento vital. Alma.
Ente imaginário
Que se prova a si mesmo de forma irrefutável.
Transformando a carne que alberga,
Desenvolvendo-a,
Criando um espírito e ser superiores.
Corpúsculo, a quem é atribuída a faculdade
De levar a vida e o sentimento
Aos diversos pontos do organismo animal
Deixando de ser apenas carne
E transformando-o em espírito da carne.
Em uníssono os dois se ligam,
Os dois evoluem e Vivem em comunhão.
Compensam-se, apoiam-se
E satisfazem-se mutuamente.
O espírito apazigua o da carne,
Quando este apenas é visto
Como objectivo sem espírito.

Dina Ventura - 2010